quinta-feira, 30 de outubro de 2008

NÓS TODOS: APAIXONADOS PELA SOCIEDADE








“EU AMO A SOCIEDADE!”



Estranha declaração de amor! Como é possível amar algo que não tem tamanho, espessura, forma e volume definidos? Como abraçar e trocar afetos com algo tão imenso, incomensurável e abstrato como a sociedade?


Absurdo isso não é pessoal? Mas trocando o tom de brincadeira para uma reflexão séria, Durkheim concebia que a sociedade, salvaguardada pelas regras morais, era realmente amada por todos os indivíduos. (Digo "eram" para me contemporizar com o autor da passagem do século retrasado para o século passado, mas posso dizer "é", no presente também. Vocês vão ver!).


AS REGRAS MORAIS ERAM O TESOURO A SER GUARDADO À SETE CHAVES!


Lembremos que Durkheim via a sociedade como uma instância superior à vida individual. A sociedade se sobressaía a qualquer vontade individual; ela era dotada de vida própria, e cuja perfeição suplantava qualquer ato ou vontade de natureza individual. A existência da sociedade independe da vontade dos indivíduos, e estes POBRES AUTÔMATOS SOCIAIS ainda por cima reconhecem e são cúmplices da AUTORIDADE que emana da vida social!!! Ai ai ai de quem ousa desrespeitar.

A prova deste AMOR INCONDICIONAL dos indivíduos pela sociedade manifestava-se (e ainda manifesta, creio eu) nas periodicidades dos rituais que marcam nossos calendários.
COMEMORAR O NATAL, PARTICIPAR DA FESTA TRADICIONAL DO BAIRRO, REZAR COM A PARÓQUIA, PARTICIPAR DAS NOVENAS, FAZER O JURAMENTO DE FORMATURA, DE POSSE DE CARGOS PÚBLICOS, ETC., É DAR UMA PROVA DE AMOR À SOCIEDADE!!!
Sim! Os RITUAIS são necessários, já dizia Saint Exupéry, em seu célebre romance infanto-juvenil “O pequeno príncipe”. Aliás, Saint Exupéry era mais Durkheimiano do que imaginávamos. O Pequeno Príncipe tinha um ritual diário: cuidar de sua rosa, dos vulcões e podar os pés de baobás. Esta repetição de sequências ordenadas, de palavras e atos expressas por meios diversificados (como a música, os atos, a fala, por exemplo), representa o esforço e a vontade da coletividade, temerosa de que seus ideais possam se perder ou desaparecer, o que seria o fim desta associação inédita e única chamada sociedade.

Por isso que os rituais não param nunca. Todos os anos se repetem, com poucas variações em todos os grupos. Muitos destes rituais são religiosos, outros como "brindar" os copos antes de beber o vinho, tornaram-se secularizados. Os rituais são tão presentes que sequer os percebemos em nossas vidas. Mas tem muitos, e a cada geração que entra ou sai, os mesmos rituais se repetem. Dizemos que eles são REVIVIFICADOS.


REPETIR OS RITUAIS E REVIVIFICÁ-LOS é dar manutenção na vida social, assim como se faz a manutenção da casa, do automóvel, a manutenção da sociedade se faz assim: através dos rituais. Ao repetir os rituais portanto, ganha-se coesão, a vitalidade e mais fôlego para a preservação do próprio grupo no tempo!!!! A revivificação ritual assegura e reabastece o grupo de energia nova!!!!

Mas cuidado aí pessoal: Durkheim é meio exagerado e severo quanto a tudo isso que estamos tratando. Leiam com desconfiança tá?

PORÉM,

[...] não deixam de ser pertinentes as observações que o velhinho francês e filho de rabino aponta, ainda mais quando entendemos que nos dias atuais a migração, diáspora, exílio, acampamento de refugiados, etc., ameaçam a continuidade de muitos grupos culturais mundo afora, retirando-os de seus grupos de origem, dezenraizando-os em sua cultura e identidade. O DEZENRAIZAMENTO AMEAÇA A POSSIBILIDADE DA CONTINUIDADE DOS RITUAIS, E POR EXTENSÃO, DA VIDA SOCIAL DO MIGRANTE.

terça-feira, 28 de outubro de 2008

DURKHEIM E O BRASIL: ELE TAMBÉM SE PREOCUPAVA CONOSCO!

Durkheim e o Brasil? Qual a relação? Aparentemente nenhuma. Nunca soube que Durkheim tenha feito sequer uma citação deste país, mas eu encontrei uma bela de uma coincidência ao ler um texto introdutório de seu pensamento, escrito por Tânia Quintaneiro, sobre vida e obra do autor, que viveu na França (Bordeaux e Paris, no século XIX e xx).


Durkheim fala da dualidade dos fatos (regras) morais, e afirma que estes são também, fatos sociais, e que como tal, expressa as mesmas características destes. Todavia, além de apresentar as características comuns a qualquer fato social (exterioridade, generalidade, coercitividade), os fatos morais apresentam também a característica de serem sentidos como COISAS AGRADÁVEIS, DE QUE DESEJAMOS E GOSTAMOS ESPONTANEAMENTE.

Tudo bem até aqui! Gostamos de manter a boa forma, de dormir cedo e não se apegar a vícios físicos e psicológicos, como cigarro, cerveja, conhaque, cachaça, pinga, chopp, martini, vodka, wisky, e tudo quanto é tipo de tóxicos. Ninguém teria coragem de afirmar o contrário, pois sentiria os tais “olhares de reprovação” da sociedade. IMAGINEM SÓ UM PAI QUE CHAMA O FILHO de três anos E DIZ: “FILHO, VEM CÁ! TOMA AQUI SEU CIGARRINHO!”. Não é preciso dizer que isto não convém à ninguém, certo? Portanto, cultivar bons hábitos que preservem a saúde, a beleza, a assiduidade no trabalho, a velocidade, a organização, a praticidade, etc., é apegar-se aos ideais coletivos, respeitados e prestigiados por todos. Quem quiser ser contra será enquandrado como anti-social.


POIS BEM, VEJAMOS ENTÃO O QUE NOS DIZ DURKHEIM, PARA QUE POSSAMOS COLOCAR O BRASIL NESSA HISTÓRIA TODA:


SOMENTE UMA SOCIEDADE CONSTITUÍDA GOZA DE SUPREMACIA MORAL E MATERIAL INDISPENSÁVEL PARA FAZER A LEI PARA OS INDIVÍDUOS; POIS SÓ A PERSONALIDADE MORAL QUE ESTEJA ACIMA DAS PERSONALIDADES PARTICULARES É QUE FORMA A COLETIVIDADE. SOMENTE ASSIM ELA TEM A CONTINUIDADE E MESMO A PERENIDADE NECESSÁRIAS PARA MaNTER A REGRA AcIMA DAS RELAÇÕES EFÊMERAS QUE A ENCARNAM DIARIAMENTE (foi o próprio Durkheim quem escreveu isso!)

ENTENDEU A BRINCADEIRA?

AÍ EU PERGUNTO À VOCÊS:

- SERÁ QUE NÓS BRASILEIROS JÁ formamos UMA SOCIEDADE CONSTITUÍDA, nos termos acima colocados? MAS PORQUE AINDA NÃO DEMOSTRAMOS a SUPREMACIA MORAL E MATERIAL PARA FAZER LEIS?



AÍ EU RESPONDO À VOCÊS:
- DEMONSTRAMOS SIM! QUEM FALOU QUE NÃO? SOMOS SIM UMA SOCIEDADE CONSTITUÍDA, NESTA PERSPECTIVA DE DURKHEIM. MAS VEJA BEM. NÃO VAMOS SAIR DA REALIDADE... VOLTEMOS À ELA:
Há pouco tempo em São Paulo surgiu (via decreto-lei) uma lei chamada “Cidade Limpa”. Seria somente mais uma "leisinha" que logo logo cairia no esquecimento de todos e das autoridades municipais. Mas aconteceu o oposto do que pensavam, e “pegou”. Toda a indústria da propaganda foi afetada pela lei, e prevalesceu a vontade moral maior – DE VIVER EM UMA CIDADE SEM OUT-DOORS, entendendo que estes prejudicam o bem-estar dos habitantes do espaço urbano e PÚBLICO. E eis que a Lei funcionou contra a expectativa de todos. Em pouco tempo fiscais da Prefeitura conseguiram tirar todos os out-doors da metrópole, e todos gostaram da idéia, e... soubemos... o Prefeito se reelegeu.


Há também o exemplo da “lei seca”, que aponta para o mesmo caminho. Diariamente os noticiários de jornais e televisão mostram os números alcançados na taxa de mortes no trânsito; estratégias utilizadas pelos jovens para retornarem em segurança dos bares e boates no meio da madrugada; as blitz dos policiais, que agora possuem maior número de bafômetros. Estas informações visam reforçar os ideais da vida coletiva, de uma sociedade constituída do ponto de vista moral e material.
Tem mais exemplos ainda... da própria Polícia Federal, que cumpre as obrigações de seu estatuto e sai a caça dos poderosos metidos em esquemas escusos de corrupção e tudo mais. Enfim, tudo isso nos leva a pensar sobre o Brasil e aceitar uma idéia nova:



NÃO SOMOS MAIS A MESMA SOCIEDADE ESTUDADA POR GILBERTO FREYRE, SÉRGIO BUARQUE DE HOLANDA, etc. RESPEITO TODOS ELES E SEUS PARENTES, MAS TEMOS ALGO DE DIFERENTE QUE ESTES AUTORES, POR NÃO ESTAREM VIVOS HOJE, NÃO PRESENCIARAM, e PORTANTO, NÃO PUDERAM CAPTAR.


UMA DESTAS TRANSFORMAÇÕES DIZ RESPEITO A APLICAÇÃO DE CERTAS LEIS VOLTADAS PARA A REALIZAÇÃO DO IDEAL DE VIDA URBANA MANTIDOS PELA COLETIVIDADE, E NÃO PRIVILEGIANDO O INTERESSE DE UM OU OUTRO GRUPO ECONOMICAMENTE MAIS FORTE.

O SUICÍDIO e o SUICIDA


O suicídio anômico era a novidade do século XIX. Suicidava-se por não ajustar-se as novas determinações da vida moderna, ao seu moralismo individualista. No século XIX Durkheim tratava o suicídio altruísta (aquele que o indivíduo suicida-se por considerar que a existência de sua comunidade, de seu povo, vale mais que a sua própria vida) como algo pertencente as sociedades tradicionais, unidas por solidariedade mecânica. Mas eis que nos dias atuais os homens-bombas começam a pipocar pelos Estados Unidos (Continente Americano), Europa (Espanha, Londres, França), Ásia (Índia, Paquistão e Países do Oriente Médio), África (Tunísia, Marrocos, Egito), e Oceania (Indonésia). E tornam-se também um fenômeno contemporâneo, contudo com certos "marcadores" que no século XIX não possuíam: para além de um suícídio altruísta, ser também um suicídio étnico e sobretudo motivado pela religião, com um inimigo declarado, ou seja, países imperialistas do ocidente e seus aliados no oriente.
Se Durkheim dizia ser o suicídio anômico o mais típico daquele período (final do século XIX), dificilmente poderia imaginar o retorno do suicídio altruísta quase cem anos depois. Disso tudo boas reflexões podem ser sugeridas, e todas elas deverão reconhecer o fato de que o MUNDO É MAIS TRADICIONAL DO QUE PENSAMOS. Daí nós, Sociólogos, ficarmos atentos as investidas da IDEOLOGIA DA PÓS-MODERNIDADE, presente na própria ciência. Uma boa saída é considerar que a modernidade sequer atingiu seu ápice, para afirmar que já a superamos, em uma nova fase, a da PÓS-MODERNIDADE. Segundo o sociólogo Antony Giddens, em seu livro As consequências da modernidade, ainda vivemos em uma fase não concluída da modernidade, que ele chama de ALTA-MODERNIDADE, e que ainda tem muito chão para afirmar a sua superação. Na ALTA MODERNIDADE os últimos grilhões das sociedades tradicionais, justamente aqueles mais radicais (por estar impregnado na raíz das comunidades tradicionais) são confrontados, e as "explosões" de violência que aparecem nos noticiários é consequência da energia que é liberada pelos vínculos comunitários tradicionais mais resistentes a moralidade individualista moderna.

sábado, 18 de outubro de 2008

Alegria de pobre dura pouco: considerações da crise econômica.


Vamos falar um pouco de temas sérios, “pesados”, da sociologia, e que flerta também com a ciência econômica. Vamos falar do que significa a atual crise econômica para o mundo. Há muitos significados envolvidos nestes acontecimentos do cotidiano econômico: seja a crise do setor imobiliário dos Estados Unidos da América, de onde tudo originou; seja a propagandeada “blindagem” da economia brasileira que, neste momento, estaria preparada como nunca para enfrentar esta crise; seja as saídas paliativas que os governos dos principais pólos econômicos mundiais (Estados Unidos, Europa e Japão) tem assumido para reverter esta situação de desequilíbrio. Este último caso é o que mais me importa discutir com vocês, caríssimos leitores.
Após este movimento de “zigue-zague” das cotações nas bolsas de valores passar, uma coisa será definitiva: a maior parte dos bancos mundiais estarão nas mãos dos governos de cada país. E isto sinaliza um novo tipo de capitalismo, com características únicas, e que para alguns sociólogos como Immanuel Wallerstein, não tem mais a essência central do modo de produção capitalista. Assim, estaríamos diante de uma transformação social e econômica que não é mais capitalista. Uma outra ordem estaria surgindo. (Veja aqui a entrevista de Immanuel Wallerstein).
O que isso representa? Na expressão mais direta e popular: uma bela de uma rasteira no liberalismo econômico. A tradição de não-intervencionismo estatal na economia – muito mais apregoada nos Estados Unidos do que na Europa – foi por água abaixo, e em termos teóricos, isso mostra a fraqueza e definhamento da “era neo-liberal”. A maior parte dos bancos privados estão sendo estatizados, ou seja, o movimento de valorização e especulação financeira a partir de então estará sob o jugo dos Estados e não mais dos respectivos banqueiros. Alguma mudança nisso tudo?
Para nós que pertencemos a “geração da crise”, isto é, nascemos e vivenciamos o grande período de estagnação dos anos 80 e 90, uma lembrança fica disso tudo: a lembrança de um pequeno e próspero momento de estabilidade, expansão do consumo, dos mercados e da economia em geral, queda das taxas de desemprego, etc. Neste ínterim de prosperidade o Brasil tornou-se - através de uma mágica numérica - um país de "classe média". Estávamos orgulhosos de nossa pujança econômica, da sensação de que o esforço da crise valera à pena! Mas o banquete estava ficando farto demais. A prosperidade durou muito pouco, talvez um ou dois anos, e acho que está chegando ao fim. Novamente retornaremos aos pífios índices de crescimentos anuais; as notícias de que amigos ou conhecidos estão desempregados ou subempregados há tantos anos...; novamente o alarmado “mercado popular ou de classe baixa”, vai voltar a obscuridade e ninguém mais vai dar bola para o consumo dos pobres...

segunda-feira, 13 de outubro de 2008

Por que não queremos dividir o banco do ônibus com ninguém...


O título deste post é somente uma provocação, já que não são todos que evitam dividir os bancos dos meios de transporte coletivo com desconhecidos. Mas também não é verdade que são todos que gostam de dividir os bancos com os mesmos desconhecidos, ou estou enganado? Sabemos muito bem das pequenas estratégias utilizadas para assegurar o banco vazio ao nosso lado: uma bolsa, uma blusa, enfim, são meios eficazes de preservar este espaço pessoal. E é neste ponto que esta questão torna-se sociologicamente pertinente, e que por isso mesmo, temos mais alguma coisa para aprender.

É necessário, antes de mais nada, explicar o que os sociólogos entendem por interação social. Em síntese, esta expressão refere-se a todo processo pelo qual indivíduos agem e reagem às pessoas que estão a sua volta. Daí ser correto, nesta perspectiva, considerar que desde o momento em que acordamos, abrimos a porta do nosso quarto e nos deparamos com a mãe fazendo café na cozinha, e logo soltamos um “bom dia”, estamos ao mesmo tempo dando início a mais um dia de múltiplas interações sociais. Portanto, nos interagimos pelos sentidos, isto é, pelo olhar (em nosso exemplo, eu olho para minha mãe) e pelo diálogo (em nosso exemplo também, eu digo bom dia para minha mãe). Há outras questões envolvidas (os traços da face, o discurso, o corpo, etc.) no processo interativo, mas para os objetivos deste post bastam as considerações acima apresentadas.

Pois bem, existe um sociólogo norte-americano pouco conhecido chamado Edward T. Hall (1914- ) cujo interesse de pesquisa são justamente estes micro-processos da vida cotidiana. Edward T. Hall fez inúmeras investigações neste campo de pesquisa, e aos poucos construiu uma tipologia (uma espécie de categorias classificatórias) das zonas de interação, em que a ocorrência da interação estava diretamente relacionada à distância que separa os sujeitos que se defrontam. Vejamos na tabela abaixo como Edward T. Hall formou esta sua tipologia das zonas de interação:

Zonas de interação

OCORRÊNCIA

DISTÂNCIA (m)

DISTÂNCIA ÍNTIMA

Entre amantes, pais e filhos

Aproximadamente 33 centímetros

DISTÂNCIA PESSOAL

Entre amigos e conhecidos íntimos

Entre 33 centímetros e 88 centímetros

DISTÂNCIA SOCIAL

Entrevistas, relações hierárquicas de trabalho

Entre 88 centímetros e 2,64 metros

DISTÂNCIA PÚBLICA

Sala de aula, palestra, reuniões, cultos religiosos

Acima de 2,64 metros

É importante ressaltar que há processos interativos em que nos colocamos muito próximos de outros indivíduos (como em uma estação de metrô muito movimentada), porém, ainda que ambos estejam dentro da zona de interação íntima, ao mesmo tempo ambos tem a consciência mútua de que estão lá naquele encontro coletivo sem a necessidade de entrar em conversação direta.

Agora estamos em condições de explicar sociologicamente por que não aceitamos muito bem a idéia de “dividir o banco do ônibus” com outrem desconhecido, ainda que contra o nosso desejo, tendemos a aceitar a idéia sem maiores constrangimentos.

A questão é simples: na interação comum, as zonas mais disputadas são as da distância íntima e pessoal. Se por acaso essas zonas são “invadidas”, as pessoas tentam recapturar seu espaço. Encaramos os “intrusos” como se disséssemos: “SAIA DAQUI!”. As marcas do rosto transmitem de forma não-verbalizada esta mensagem. Alguns ultrapassam as normas da boa convivência e faz uso de cotoveladas (como nas filas para a compra de objetos escassos, como entradas para assistir a um megashow, por exemplo).

Quando os indivíduos são forçados a se aproximarem mais do que julgam necessário, podem até mesmo criar algum tipo de fronteira física. Um leitor em uma biblioteca, por exemplo, senta-se na mesa mais vazia do espaço (de preferência longe do campo de visão de todos) e pode até mesmo colocar livros nas bordas das mesas para evitar uma proximidade maior. Eu mesmo já testemunhei muitos processos deste tipo e que, curiosamente, aconteciam entre os próprios “aprendizes de sociólogos” na biblioteca do campus universitário.



Portanto, da próxima vez que nos encontrarmos em situações de disputa de zonas de interação, lembrem-se deste post: não é porque somos egoístas ou mesquinhos, mas sim porque estamos resguardando o nosso espaço de interação íntima ou pessoal somente para alguns dos nossos conhecidos. Abraço à todos!

quinta-feira, 9 de outubro de 2008

sociologia dos que estão embaixo




Caros amantes da Sociologia: abram este vídeo e observem os pés... somente os pés. Aparentemente são todos iguais. Temos uma idéia preconcebida dos pés: simétricos, com cinco dedos em cada um e alguns ossos sobressalentes. Isso! Mas são pés de indivíduos inseridos na vida social, nas relações sociais da vida cotidiana, e pelos pés observamos a pessoa.

Pelos pés conseguimos inferir, advinhar, imaginar, quem são os seus donos. A começar pelo que vestem: se são pés calçados ou descalços, se - quando calçados - são calçados novos ou velhos, bonitos ou feios, modernos ou tradicionais, tênis ou sandália de couro, congas ou Kichutes. A partir daí aumentamos a nossa capacidade de imaginar: se são ricos ou pobres, se são brancos ou negros, em que trabalham, se são jovens ou velhos, se são mulheres ou homens, se sofrem as misérias da vida ou não, se estão desempregadas, mendigando ou não, se são pedintes que vivem de esmolas ou não, se estão paradas ou em movimento, se vão ou se ficam. E tem mais ainda: podemos imaginar o lugar em que se pisa, isto é, o chão. Se é asfalto ou de cascalho, se é de terra batida ou não, se tem buracos e poças de água ou esgoto a céu aberto. Excelente vídeo que estimula e exercita a IMAGINAÇÃO SOCIOLÓGICA! Abraços a todos.




Folia de Reis... de onde veio?


Em nome de Deus começo


Nesta abençoada hora

Pai, filho, Espírito Santo

São José e Nossa Senhora




Caríssimos leitores, o trecho acima representa em versos o momento mais esperado do ano para muitos devotos e foliões de Santos Reis espalhados pelo Brasil. É um trecho de uma toada cantada pelas Companhias de Santos Reis. No interior de São Paulo, e até mesmo na capital - no Parque da Água Branca por exemplo - não é difícil encontrar Companhias de Reis perambulando, juntamente com o séquito de foliões, atrás da bandeira toda cheia de fitas, não é? Vamos então, "romper a barreira do som", e ultrapassar o nível ordinário de conhecimento sobre folias de reis. Vamos nos ascender um pouco mais para um outro plano de apreensão desta realidade, que irá nos permitir entender mais sobre a dinâmica das tradições do catolicismo popular no Brasil.

A Folia de Reis, ou Festa de Santos reis é uma tradição, isto é, está vinculada a vida comunitária, as relações pessoais, unidas pela similaridade nos valores e na crença. E qual é a crença? Nos poderes mágicos-curativos dos Três Reis Magos, que sequer são considerados Santos pela igreja católica, até hoje! Lembram do nome deles? Baltazar, Belchior e Gaspar. Na Bíblia (Mateus, Cap. 02, versículo de 1-12), que entendemos por tradição escrita, está o fundamento "oficial" das crenças nos poderes dos Três Reis Magos. A história bílbica escrita mistura-se com a outra história, dos que não sabem ler nem escrever, mas que por isso mesmo possuem imensa capacidade de imaginação: falo da história de tradição oral, da oralidade muito característica do brasileiro. Misturando tudo escrita + oralidade, o resultado fica mais ou menos assim:

... Após o nascimento do Menino Jesus, os Reis que estavam no Oriente foram avisados em sonho por Deus, que lhes enviou um sinal. A Estrela Guia! O brilho intenso da Estrela Guia chamou demais a atenção dos Três Reis que logo perceberam tratar-se de um sinal do nascimento “daquele que veio para nos salvar”, conforme cantam as toadas das Companhias de Reis.

Portanto não havia dúvidas de que era o “salvador dos homens” que teria nascido. E o que fizeram os Três Reis? Seguiram a estrela, e levaram presentes: incenso, ouro e mirra. Mas a caminhada em direção ao menino Jesus só podia ser feita à noite, porque afinal de contas estrela só brilha de noite, não é verdade?

E eis que chegando em Jerusalém os Três Reis foram surpreendidos pelo famigerado Rei Herodes, que enciumado e com medo de perder o trono para o suposto e verdadeiro Rei da humanidade, armou uma armadilha para se livrar de “Jesus” que havia nascido. E qual foi a armadilha por ele criada? Dizendo estar preocupado com os Três Reis, que iriam seguir à noite de Jerusalém até Belém onde se encontrava o “menino-Deus”, ofereceu dois soldados para fazer guarda a eles.

Todavia a intenção real era descobrir a “manjedoura”, e assim dar fim com a vida de Jesus. Fazendo isso Herodes iria preservar o seu destino como rei, sem sofrer maiores ameaças.

E então acontece o inusitado: no caminho, de Jerusalém à Belém, os dois soldados romanos que seguiam os Três Reis sentiram a verdadeira força e amor presente no pé da “manjedoura”, e se converteram à Jesus. E fazendo isso não cumpriram com a intenção real do Rei Herodes, que era a de matá-lo.

Felizes em presentear Jesus com o incenso, o ouro e a mirra, os Três Reis retornaram para o Oriente sem passar por Jerusalém, onde certamente o Rei Herodes iria tirar-lhes satisfações. Nesta volta eles iam cantando versos de alegria e redenção por terem dado provas do nascimento do “senhor dos homens”. Os soldados romanos convertidos também voltaram, todavia, fingiram estar em trabalho para o Rei Herodes, sendo que na verdade não estavam mais. O resultado disso tudo? Tem dois resultados: o primeiro é muito triste e ficou conhecido na história como o “massacre dos inocentes”. O que é isso? Vou explicar: o Rei Herodes, muito bravo pela traição dos soldados não tinha outra saída a fim de preservar o seu reinado senão mandar matar todas as crianças da Galiléia com menos de dois anos. Foi um verdadeiro banho de sangue, e que é igualmente contado na Bíblia.

Mas eu disse que existiam dois resultados de toda essa trama. O primeiro já foi contado. E o segundo qual é? É que dessa história surgiu uma tradição apropriada pelo povo de encenar ritualmente a visita dos Três Reis Magos indo ao encontro do nascimento de Jesus. Aqui no Brasil esta tradição é denominada de Folia de Reis, ou Festa de Santos Reis, variando de lugar para lugar.

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RECADO AOS SOCIÓLOGOS ACADÊMICOS

O Brasil tem na universidade o reduto clássico dos Sociólogos. Dificilmente vocês encontrarão sociólogos trabalhando em outros lugares (empresas, escolas, profissional liberal, etc.). Existem várias razões de ser assim: a tradição do conhecimento sociológico que herdamos na universidade tem pouca serventia para outras áreas da vida. Nos Estados Unidos por exemplo, sabemos que os sociólogos são considerados os mais experts em estatística, pesquisa quantitativa, SPSS (software de tabulação e cruzamento de dados). Por isso nos Estados Unidos os Sociólogos conseguem ter muito mais inserção do que aqui no Brasil, onde poucos se dão bem no mundo do trabalho. Eu, por exemplo, tenho que ensinar geografia para ser sociólogo! Isso é um grande contrasenso. Bom seria ensinar sociologia. Mas ainda não chegou a hora. Enfim! Quero dizer para meus amigos sociólogos que vocês não encontrarão nada no formato padrão, tal qual estamos acostumados a ler. Aqui não existem citações da ABNT, não existem citações literais de livros da literatura sociológica, não existem biografias de autores clássicos e contemporâneos. Se eu considerasse tudo isso, o "povo" que quer conhecer o "mundo" pela sociologia sequer se aproximaria das minhas letras. Daí que optei pela linguagem simples e próxima do dia-a-dia de todos. Posso estar cometendo pecados, sacrilégios, enfim. Mas o que me importa é transmitir a idéia de que a sociologia - antes de qualquer definição - é um MOVIMENTO DO PENSAMENTO, em que partimos das situações aparentemente banais da vida ordinária e cotidiana, para elevar a reflexão a um outro plano de compreensão, mas abstrato, amplo e extraordinário. Isso é a tal da IMAGINAÇÃO SOCIOLÓGICA, e que todos podemos exercitar. CERTO? Grande abraço à todos.

Olá, muito prazer!

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Sociólogo apaixonado pela vida, pelo convívio e pela imaginação.