quinta-feira, 9 de outubro de 2008

Folia de Reis... de onde veio?


Em nome de Deus começo


Nesta abençoada hora

Pai, filho, Espírito Santo

São José e Nossa Senhora




Caríssimos leitores, o trecho acima representa em versos o momento mais esperado do ano para muitos devotos e foliões de Santos Reis espalhados pelo Brasil. É um trecho de uma toada cantada pelas Companhias de Santos Reis. No interior de São Paulo, e até mesmo na capital - no Parque da Água Branca por exemplo - não é difícil encontrar Companhias de Reis perambulando, juntamente com o séquito de foliões, atrás da bandeira toda cheia de fitas, não é? Vamos então, "romper a barreira do som", e ultrapassar o nível ordinário de conhecimento sobre folias de reis. Vamos nos ascender um pouco mais para um outro plano de apreensão desta realidade, que irá nos permitir entender mais sobre a dinâmica das tradições do catolicismo popular no Brasil.

A Folia de Reis, ou Festa de Santos reis é uma tradição, isto é, está vinculada a vida comunitária, as relações pessoais, unidas pela similaridade nos valores e na crença. E qual é a crença? Nos poderes mágicos-curativos dos Três Reis Magos, que sequer são considerados Santos pela igreja católica, até hoje! Lembram do nome deles? Baltazar, Belchior e Gaspar. Na Bíblia (Mateus, Cap. 02, versículo de 1-12), que entendemos por tradição escrita, está o fundamento "oficial" das crenças nos poderes dos Três Reis Magos. A história bílbica escrita mistura-se com a outra história, dos que não sabem ler nem escrever, mas que por isso mesmo possuem imensa capacidade de imaginação: falo da história de tradição oral, da oralidade muito característica do brasileiro. Misturando tudo escrita + oralidade, o resultado fica mais ou menos assim:

... Após o nascimento do Menino Jesus, os Reis que estavam no Oriente foram avisados em sonho por Deus, que lhes enviou um sinal. A Estrela Guia! O brilho intenso da Estrela Guia chamou demais a atenção dos Três Reis que logo perceberam tratar-se de um sinal do nascimento “daquele que veio para nos salvar”, conforme cantam as toadas das Companhias de Reis.

Portanto não havia dúvidas de que era o “salvador dos homens” que teria nascido. E o que fizeram os Três Reis? Seguiram a estrela, e levaram presentes: incenso, ouro e mirra. Mas a caminhada em direção ao menino Jesus só podia ser feita à noite, porque afinal de contas estrela só brilha de noite, não é verdade?

E eis que chegando em Jerusalém os Três Reis foram surpreendidos pelo famigerado Rei Herodes, que enciumado e com medo de perder o trono para o suposto e verdadeiro Rei da humanidade, armou uma armadilha para se livrar de “Jesus” que havia nascido. E qual foi a armadilha por ele criada? Dizendo estar preocupado com os Três Reis, que iriam seguir à noite de Jerusalém até Belém onde se encontrava o “menino-Deus”, ofereceu dois soldados para fazer guarda a eles.

Todavia a intenção real era descobrir a “manjedoura”, e assim dar fim com a vida de Jesus. Fazendo isso Herodes iria preservar o seu destino como rei, sem sofrer maiores ameaças.

E então acontece o inusitado: no caminho, de Jerusalém à Belém, os dois soldados romanos que seguiam os Três Reis sentiram a verdadeira força e amor presente no pé da “manjedoura”, e se converteram à Jesus. E fazendo isso não cumpriram com a intenção real do Rei Herodes, que era a de matá-lo.

Felizes em presentear Jesus com o incenso, o ouro e a mirra, os Três Reis retornaram para o Oriente sem passar por Jerusalém, onde certamente o Rei Herodes iria tirar-lhes satisfações. Nesta volta eles iam cantando versos de alegria e redenção por terem dado provas do nascimento do “senhor dos homens”. Os soldados romanos convertidos também voltaram, todavia, fingiram estar em trabalho para o Rei Herodes, sendo que na verdade não estavam mais. O resultado disso tudo? Tem dois resultados: o primeiro é muito triste e ficou conhecido na história como o “massacre dos inocentes”. O que é isso? Vou explicar: o Rei Herodes, muito bravo pela traição dos soldados não tinha outra saída a fim de preservar o seu reinado senão mandar matar todas as crianças da Galiléia com menos de dois anos. Foi um verdadeiro banho de sangue, e que é igualmente contado na Bíblia.

Mas eu disse que existiam dois resultados de toda essa trama. O primeiro já foi contado. E o segundo qual é? É que dessa história surgiu uma tradição apropriada pelo povo de encenar ritualmente a visita dos Três Reis Magos indo ao encontro do nascimento de Jesus. Aqui no Brasil esta tradição é denominada de Folia de Reis, ou Festa de Santos Reis, variando de lugar para lugar.

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RECADO AOS SOCIÓLOGOS ACADÊMICOS

O Brasil tem na universidade o reduto clássico dos Sociólogos. Dificilmente vocês encontrarão sociólogos trabalhando em outros lugares (empresas, escolas, profissional liberal, etc.). Existem várias razões de ser assim: a tradição do conhecimento sociológico que herdamos na universidade tem pouca serventia para outras áreas da vida. Nos Estados Unidos por exemplo, sabemos que os sociólogos são considerados os mais experts em estatística, pesquisa quantitativa, SPSS (software de tabulação e cruzamento de dados). Por isso nos Estados Unidos os Sociólogos conseguem ter muito mais inserção do que aqui no Brasil, onde poucos se dão bem no mundo do trabalho. Eu, por exemplo, tenho que ensinar geografia para ser sociólogo! Isso é um grande contrasenso. Bom seria ensinar sociologia. Mas ainda não chegou a hora. Enfim! Quero dizer para meus amigos sociólogos que vocês não encontrarão nada no formato padrão, tal qual estamos acostumados a ler. Aqui não existem citações da ABNT, não existem citações literais de livros da literatura sociológica, não existem biografias de autores clássicos e contemporâneos. Se eu considerasse tudo isso, o "povo" que quer conhecer o "mundo" pela sociologia sequer se aproximaria das minhas letras. Daí que optei pela linguagem simples e próxima do dia-a-dia de todos. Posso estar cometendo pecados, sacrilégios, enfim. Mas o que me importa é transmitir a idéia de que a sociologia - antes de qualquer definição - é um MOVIMENTO DO PENSAMENTO, em que partimos das situações aparentemente banais da vida ordinária e cotidiana, para elevar a reflexão a um outro plano de compreensão, mas abstrato, amplo e extraordinário. Isso é a tal da IMAGINAÇÃO SOCIOLÓGICA, e que todos podemos exercitar. CERTO? Grande abraço à todos.

Olá, muito prazer!

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Sociólogo apaixonado pela vida, pelo convívio e pela imaginação.